A Filosofia Moderna foi um movimento de busca pela autonomia da razão humana em relação à religião. Na Idade Media, a religião era a autoridade máxima, e, embora a ciência tenha surgido aí e o espírito inventivo e experimental tenha se beneficiado do otimismo cristão em relação ao mundo, toda forma de conhecimento natural estava sempre submetida à Igreja. A Filosofia, que se desenvolveu muitíssimo no período medieval, sobretudo com os escolásticos, era chamada de "serva da teologia", e se houvesse qualquer discordância entre a teologia e qualquer ramo das ciências naturais, já se sabia de antemão que o erro estava no lado dessas últimas.
A Idade Moderna buscará a independência do saber humano. Surgirá uma vida intelectual fora do ambiente das universidades medievais, que eram terrenos eclesiásticos, e se lutará pelo desenvolvimento sem limites da razão natural. As ciências medievais tinham um caráter sobretudo contemplativo, não instrumental. Agora, porém, as ciências visarão conhecer o mundo para que este possa ser manipulado em função do conforto humano. A ciência, por este motivo, se desenvolve intensamente e o espírito da época marca uma passagem de autoridade: se antes a referência dos mistérios do mundo era a Igreja, agora o cajado é passado à ciência. Para compreendermos essa passagem, basta perguntar: quem procuramos hoje quando estamos doentes? Um padre/pastor ou um médico? Com algumas exceções, a maioria, ainda que não descarte as orações, procura o médico e o seu saber científico.
Galileu Galilei representou bem esse movimento de passagem. Demonstrando, por meio de observações, que não era o sol que girava em torno da terra, mas o contrário, ele ajudou a estabelecer uma visão de mundo totalmente nova, fato que chamou a atenção da Igreja porque parecia que a contrariava. Acontecia, então, um dos primeiros atritos históricos entre a Ciência e as crenças estabelecidas ou inspiradas na religião. Não é que Galileu fosse ateu ou antirreligioso. Ele era um católico devoto e, como tal, acreditava na função sagrada da Igreja. Do que se tratava, então? Uma frase sua expressará o motivo da divergência: "A Sagrada Escritura diz como se vai ao Céu, e não como vai o céu".
Dizendo isto, Galileu afirmava que o terreno atuado pela Igreja, o da Fé e o da Moral, era diferente do terreno da Ciência, que buscava dizer como o universo se comporta. A Religião não podia ter a pretensão, segundo ele, de fazer afirmações científicas, pois fugiria, assim, do seu campo original.
Era então o período da Contra Reforma, um movimento católico de resposta à Reforma Protestante iniciada por Lutero. Grande parte da polêmica luterana se deveu justamente à interpretação das Escrituras. Agora, num momento de grande sensibilidade, Galileu aparece dando lições à Igreja de como a Sagrada Escritura deve ser lida. O conflito se acirrou e Galileu foi condenado pela Inquisição à prisão domiciliar e a abjurar as suas teses.
Essas tensões entre a religião e a ciência foram se repetindo no decorrer da história, às vezes assumindo a forma de um atrito entre ciência e ética. Até hoje, a ciência se vê restringida por ter de respeitar os limites morais vigentes. Não é parte da ciência dizer se algo é correto ou errado. Cabe à ética essa função. Por isso, a religião sempre se verá impedida de extrapolar certos limites. As armas nucleares são exemplos clássicos de como a ciência pode não somente contribuir para o desenvolvimento humano, mas também pode nos aproximar da barbárie. Outros pontos moralmente sensíveis tratados pela ciência são a questão da clonagem, da inseminação artificial, o discurso sobre o momento exato em que começa a vida, o uso de células tronco embrionárias, etc.
Esse movimento de confiança exacerbada na razão, que caracteriza a modernidade, culminará na experiência das duas guerras mundiais e numa reação, em seguida, exatamente oposta: a de desconfiança na razão e de desesperança na bondade humana
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